Sou feliz por
ter nascido
no tempo dos
homens-rãs
que descem ao
mar perdido
na doçura das
manhãs.
Mergulham,
imponderáveis,
por entre as
águas tranquilas,
enquanto
singram, em filas,
peixinhos de
cores amáveis.
Vão e vêm,
serpenteiam,
em compassos
de ballet.
Seus lentos
gestos penteiam
madeixas que
ninguém vê.
Oh que
insólita beleza!
Festivo
arraial submerso.
Poema em
líquido verso.
Biombo de
arte chinesa.
No colóquio
voluptuoso
dessa alegria
pagã,
babam-se os
olhos de gozo
na máscara do
homem-rã.
Suspensas e
sonolentas,
rendas de
bilros voláteis,
esboçam-se as
formas contrácteis
das medusas
nevoentas.
Num breve
torpor elástico,
como dobras
de sanefas,
estremecem as
acalefas
e as
alforrecas de plástico.
Com
barbatanas calçadas
e pulmões a
tiracolo,
roçam-se os
homens no solo
sob um céu de
águas paradas.
Passam por
entre as lisonjas
das anémonas
purpúreas,
por entre
corais e esponjas,
hipocampos e
holotúrias.
Sob o
luminoso feixe
correm de um
lado para o outro,
montam no lombo de um peixe
montam no lombo de um peixe
como no dorso
de um potro.
Onde as
sereias de espuma?
Tritões
escorrendo babugem?
E os monstros
cor de ferrugem
rolando
trovões na bruma?
Eu sou o homem. O Homem.
Desço ao mar
e subo ao céu.
Não há
temores que me domem.
É tudo meu,
tudo meu.
António
Gedeão, ín "Poesias Completas", 1956-1967,Lisboa,
Portugália Editora, 1975, 5.ª ed.
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