domingo, 29 de agosto de 2010

O Oceano é uma delgada camada de água


Há alguns anos, quis manter dentro do oceano um olho aberto de forma permanente, de modo que equipei a proa do meu navio, o Calypso, com um observatório submarino. Nessa altura, estava convencido de que os oceanos eram imensos, estavam repletos de vida e tinham todo o tipo de recursos. Durante longos percursos pelo Oceano Indico ou pelo Atlântico, passei muitas horas, tanto de dia como de noite, observando através dos meus postigos submarinos, sonhando com o capitão Nemo e o seu Nautilus. Mas pouco tempo depois, tive que aceitar a evidência: as águas azuis do mar aberto tinham, na maior parte das vezes, o aspecto desalentador de um deserto. Como nos desertos terrestres, estava muito longe de estar morto; mas o ingrediente vivo, o plâncton, formava uma camada delgada, como uma neblina, ligeiramente visível e monótona. Para além disso, em raras ocasiões, havia zonas que se convertiam em lugares de reunião; perto das margens ou nos baixios, ao redor das algas flutuantes ou de restos de naufrágios, costumavam reunir-se os peixes, oferecendo um espectáculo de vitalidade e beleza. Depois de mergulhar durante anos, descobri que acontece o mesmo no fundo do mar. Aí, bem como na zona intermédia, podem ver-se desertos intermináveis, no meio dos quais aparece, de vez em quando, um oásis exuberante.
A “teoria do oásis” iria ajudar-me a compreender que o oceano, apesar da sua grandeza, se medido numa escala humana, não é mais que uma delgada camada de água que cobre a maior parte do nosso planeta (que, de facto, é um mundo muito pequeno), que é extremamente frágil e que está à nossa mercê. Contudo, a vida teve origem no oceano primitivo, há aproximadamente, três mil e quinhentos milhões de anos em forma de células muito simples. (...) A vida, que nasceu na água, deve ser pelo menos tão escassa como a água no universo, e por isso merece ser reverenciada, em qualquer das suas formas, como um milagre. (...)Noutra ocasião, quando mergulhava no mar Vermelho, no arquipélago que está em frente de Suakin, descobri que a água era tão clara, que os tubarões e as barracudas pareciam suspensos em um nada tridimensional, ao redor de exuberantes comunidades de recifes coralinos, uma mistura de zonas coloridas e de seres alvoraçados que nadavam, flutuavam, se arrastavam e simplesmente ali estavam; no recife reinava um grande barulho: coros de suaves rangidos, grunhidos e silvos executavam uma vibrante sinfonia em honra dos milagres da vida e da morte. Ai aprendi que na variedade está a essência de um sistema de vida saudável.
Na realidade, o mar condiciona todas as actividades humanas, gera a chuva, as inundações ou as secas, provoca mudanças constantes, tão lentas como bruscas, graduais como catastróficas. O nosso “futuro líquido” depende da previsão, do cuidado e do amor com que tratamos a nossa única fonte de água: os oceanos.
Entretanto o diminuto pulsar da vida, que floresce no meio do mar, continua a converter brilhantes gotinhas de água em jóias viventes. O milagre da vida desafia a lei universal da degradação, cria moléculas orgânicas extremamente complexas, organiza a matéria caótica em estruturas incrivelmente programadas, compostas por biliões de células. A contemplação da vida inspirou ao padre Teilhard de Chardin a sua meditação sobre os três infinitos: alem do infinitamente grande e o infinitamente pequeno, Teilhard falou-nos no infinitamente complexo a VIDA.
Jacques Cousteau in  "A Odisseia Submarina "

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